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A mostrar mensagens de novembro, 2005

Abandono OU Eterno Abraço

Vens nas noites calmas de Inverno. A chuva cai lá fora, num outro espaço que não é o meu, num outro silêncio de que não fazes parte. Os meus dedos acompanham o correr dos pingos da chuva nas vidraças de uma janela há muitos anos fechada para o mundo. Vejo o escuro do céu como companheiro apaziguador da luz que me tolda os pensamentos e recordo o que outrora fui nessas estrelas brilhantes que pensam iluminar a atmosfera pesada do universo. O fogo crepita na lareira e as últimas velas derretem ao sabor das chamas. Daqui a pouco, quando a última centelha se extinguir, ficarei submersa nas sombras e no silêncio. E o bater do coração cessará também. E a imensidão da noite acolher-me-á para a eternidade. Não tenho medo. Anseio por esse momernto há muitos anos. Já se acabou a comida, e a água deposta no cântaro é turva e sabe a lágrimas que caíram pelo meu rosto em espasmos abundantes há alguns dias. Não tenho medo. Deixei de chorar quando percebi que isso me mantinha viva e lúcida. Se a lo

Sem Sentido

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Abraça-me devagarinho nessa dormência rouca em que me projectas no infinito. Olhares que se cruzam, ávidos de sabedoria. O universo não existe. O sonho é tudo. A vida é o nada de promessas desfeitas e caprichos desmedidos que assolam o pensamento de alguém que morre cada vez que renasce pelo orgasmo das emoções irrepreendidas. Sente o quanto eu quero desprender-me em cada gesto que faço para me ancorar em ti. Em cada palavra de amor que te digo, em cada olhar de desejo, em cada carícia inocente que não te faço. O que é isto? Isto é o princípio inacabável de um não-sei-o-quê que se me impõe e se me revela à mesma luz ofuscante e baça que vejo e revejo dolorosamente. Isto é o fim de tudo o que não começou. Isto não sou eu e é cada um de nós. O que quero eu de mim? O que queres tu? O que queremos nós, vós, eles e um turbilhão de vozes indecifráveis que se misturam nas sombras negras da minha alma? Eu não tenho alma. Dei-me ao vento e ele levou-me para um espaço intermitente entre o ser e

Fim de tarde

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Procurei-te nas tardes de sonhos reprimidos e insatisfeitos. Vieste, enfim, com cheiro a saudade e sabor a carícias, coroado com a espuma das ondas. Recolhi-me ao teu corpo dourado do sol e escondi-me do mundo. "Protege-me!!" Abriste os braços e deixaste entrar o sol do entardecer, que penetrou o meu coração e o deixou em lágrimas. "Adeus." O mar recuou e no teu lugar ficou um rasto de luz. Perdurou no horizonte do inconsciente, ofuscou-se pelas sombras pontiagudas das rochas, gigantescas, sobre mim. Maré salgada, lágrimas de sal - a fusão do universo com a criatura. Voltei algum tempo depois. Quanto? Muito... Voltei e vi o mesmo céu ao fim de tarde, as mesmas ondas coroadas de espuma, a mesma areia quente, sedosa e dourada. E a luz ainda lá estava. "Já não sinto nada..." Voltei as costas, mas dois braços envolveram-me e apertaram-me e fecharam-se em mim num abraço profundo. "Deixa-me proteger-te..." Abri os olhos e vi um outro alguém. E os raio

Confissão

O que é a existência senão a mera transfiguração do ser em auras e momentos de luz e sombra? Ou de ambos... todo o ser é ambíguo e mutável, capaz de se moldar e modelar a partir de si mesmo ou do ambiente em que se projecta. Passamos do ódio ao amor, da tristeza à alegria exuberante tão espontaneamente que por vezes - na maioria das vezes - essa transição é quase imperceptível. Eu carrego em mim o sabor da vida porque existo, porque me identifico com a vida nas suas vertentes de sofrimento, contemplação, alegria e luta, porque sinto em mim a vontade de ser. E ser significa conquistar, conhecer, aprender, mas também significa cair. E é nessa altura que o ciclo se renova . Desistir . Pensei nisso em diversas alturas. Pedi à minha vontade que fizesse o mesmo, e ela riu-se da minha fraqueza e mostrou-me que a vida em si é já um objectivo, senão O objectivo real, primordial, derradeiro. Quando olho para trás vejo inocência, revolta, fraqueza, dor, alegria, cansaço, aprisionamento, orgulho,