Confissão

O que é a existência senão a mera transfiguração do ser em auras e momentos de luz e sombra? Ou de ambos... todo o ser é ambíguo e mutável, capaz de se moldar e modelar a partir de si mesmo ou do ambiente em que se projecta. Passamos do ódio ao amor, da tristeza à alegria exuberante tão espontaneamente que por vezes - na maioria das vezes - essa transição é quase imperceptível.
Eu carrego em mim o sabor da vida porque existo, porque me identifico com a vida nas suas vertentes de sofrimento, contemplação, alegria e luta, porque sinto em mim a vontade de ser. E ser significa conquistar, conhecer, aprender, mas também significa cair. E é nessa altura que o ciclo se renova.
Desistir. Pensei nisso em diversas alturas. Pedi à minha vontade que fizesse o mesmo, e ela riu-se da minha fraqueza e mostrou-me que a vida em si é já um objectivo, senão O objectivo real, primordial, derradeiro.
Quando olho para trás vejo inocência, revolta, fraqueza, dor, alegria, cansaço, aprisionamento, orgulho, determinação, sucesso, perda, felicidade... de tudo um pouco. Mas a vontade, essa esteve sempre presente e motivou todas as minhas acções.
Não sou diferente de ninguém, e no entanto já vivi coisas que a maioria das pessoas da minha geração ainda nem projectam e esperam nunca experienciar. Não sou velha, tenho a vida à minha frente, mas já conheci uma boa parte. Já amei, já odiei, já esqueci... pesa-me o luto que recalquei na mente - mas não no coração, nunca! -, de dois anjos pequeninos que se libertaram da vida mal a conheceram... Recordo a cada segundo o conforto e um sentimento de amor incondicional ao ver ou lembrar um terceiro anjo que aperto em meus braços todos os dias e quye me chama Mamã mesmo sem poder ver o meu rosto... Já casei, já me divorciei, já me arrependi de muitas coisas... Já acarinhei, maltratei, já menti e fui sincera... e todas estas ambiguidades ou opostos foram feitos ou sentidos com a mesma intensidade. Sim, já tentei pôr um termo à minha existência, mas o desejo de perseguir os meus sonhos foi mais alto, mostrou-me uma outra via mais aliciante: a da luta. E é isso que estou a fazer. E é isso que todos devemos fazer.
Quem sou eu? Um acumular de tudo isto e, no entanto, de nada. Eu sou eu. Sou como me querem ver e sou como eu me vejo, mas nunca abdiquei da segunda para me tornar na primeira. Já errei muito, tanto!, mas dei uma, duas, mil hipóteses a mim própria para me melhorar à luz dos meus valores e da minha ideia do que é correcto. Aos que realmente me interessam, aqueles que me amo e que me amam ou amaram, peço somente mais uma oportunidade para mostrar que mudei, que me esforço e me auto-analiso cada vez com mais exigência, e que me ajudem dando-me de volta um espaço no seu coração. Peço isto a quem feri, a quem humilhei, a quem reneguei, e a quem quero bem.
E com estas linhas não quero dizer que sou ou quero ser perfeita. Eu nunca serei perfeita, nunca serei um ideal. Eu ando cá por baixo, rente à terra, a tentar ser melhor e alcançar somente a pétala de uma flor num mundo de árvores e mar e céu.
28-10-2005

Comentários

Solange Gomes disse…
Em primeiro lugar, obrigada pela tua visita ao meu blog.
O que voce escreveu aqui me tocou bastante. Espero que tudo aquilo que voce deseje se realize e voltarei cá para te "ler"
Sol e anjinhos
Vitor Soares disse…
Para variar, um texto muito bom :)
Andas a escavar bem dentro de não é?
TomSawyer disse…
todos nos temos o direito de errar...e estou certo que toda a gente compreende isso e que te vao perdoar...mais cedo ou mais tarde vais encontrar e tua petala :) motivaçao nao t pode faltar com um anjo na ta vida :) beijo
JC disse…
Sao as experiencias que fazem o nosso ser.
Não há boas nem más, são elas que fizeram de mim o que sou hoje. A melhor forma de gostar de mim é abraçando todas de igual modo ;)
Gostei de te ler ;)

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