Gelo de Sangue

E, devagarinho como quem mede as distâncias, como quem calcula cada passo, mas com a espontaneidade própria do instinto, Lana gravou em pedra as seguintes palavras:


Diman,
Lembras-te da noite em que me fizeste tua pela primeira vez? De veres a felicidade no meu olhar quando me abracei a ti e te deixei tornares-me mulher, tu já um homem, determinado, carente? Lembras-te da intensidade com que te amei durante anos, adorando a tua força, a tua personalidade, a forma como falavas e olhavas para mim, o teu corpo? Lembras-te de juntos olharmos o céu e nos fundirmos nele, de mansinho, das promessas de amor, de me tomares em teus braços e dançarmos de forma mágica, esquecendo tudo à nossa volta? Lembras-te de eu te dizer que nunca amaria outro, que iria esperar por ti sempre, que nunca, nunca te iria esquecer?
Lembras-te de quantas vezes me fizeste sofrer e eu te perdoei? Da vez em que mataste algo em mim e eu fiz por esquecer que tinha acontecido?
Não, Diman, eu nunca te esquecerei. Como posso esquecer a brutalidade, a violência com que pagaste o meu amor e tudo o que eu fiz, tudo aquilo que eu abdiquei por ti? Como posso esquecer o pavor, o sentir vontade de morrer para não mais suportar? E não, eu nunca amarei outro, mas isso não significa que ainda te amo. Ao contrário, Diman, significa que me fizeste achar que não vale a pena amar com o coração. Fizeste-me esquecer que amor é confiança, sinceridade, compreensão. Eu não quero voltar a amar, se amar é isto, perder anos da minha vida presa à ilusão da pureza de um amor que se revelou sujo e amargo?
Como tantas vezes te disse: "amo-te", hoje venho dizer-te: "Odeio-te. Nunca vou deixar de te odiar". Ah, Diman, eu quero a tua queda. Quero assistir na primeira fila à tua derrocada, ao teu fracasso como homem. Fizeste-me abdicar de princípios, da minha forma de ser e de ver a vida. Nunca te perdoarei. E não, Diman, nunca permitirei que tu tentes sequer destruir aquilo que de melhor eu tenho na vida, ainda que faça parte de ti. Não, não tentes sequer, pois se o fizeres ficarás a conhecer a pessoa em quem me transformaste.
Lana chorava quando acabou de escrever. Ergueu-se, limpou as lágrimas, ergueu a cabeça, e seguiu em frente.

Comentários

Sophia disse…
Este texto poético faz-me lembrar, cada vez que o leio (e já vou na 3ª vez...), a escrita da Marion Zimmer Bradley, em especial as obras da série Darkover (que não é muito conhecida)... Sim, é um elogio e é difícil explicá-lo. Talvez só o entenda quem conhecer essa série. Resumindo: não sei se era este que dizias que estava estranho, mas eu gostei muito. Mesmo muito. Não queria ser repetitiva mas, mais uma vez, parabéns! :)
Heavenlight disse…
Minha querida amiga,
Não conheço essa série... tens de me emprestar! Fiquei curiosa de perceber este teu elogio!
Obrigada pelo teu comentário. Ainda bem que gostaste! Jinhos!
Anónimo disse…
Percebo muito bem o significado deste texto e da importância que ele tem para ti. Senti-me também muito identificada com a Lana, mas também segui em frente. Agora eu sou feliz, e sei que tu, também o és. Vou guardar este texto, porque ele está genial.

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